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Agropecuária, um fardo para natureza e saúde humana

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Cláudia Maranhoto, dietista

Julho 2012

Não existe outra criatura à face da Terra que utilize, em seu favor, os fenómenos naturais de forma tão eficiente como o Homem. Desde os primórdios dos tempos, que o ser humano tenta desenvolver técnicas cada vez mais eficazes com o objetivo de facilitar a sua vida quotidiana. Começando pela descoberta do fogo ou a invenção da roda, passando pela invenção da imprensa e da máquina a vapor (Revolução Industrial) o homem desde cedo tenta superar-se buscando e rebuscando ferramentas que o auxiliem na conquista do seu bem-estar. Ainda que inicialmente essa busca seja movida pelo objetivo primário de melhorar e facilitar a vida da humanidade, esta não deixa de ser, em última instância, uma busca por domínio, por poder, sobre o seu semelhante e sobre o mundo.

A tecnologia e os seus avanços são fruto dos interesses económicos, do capitalismo, e neste sentido o seu equilíbrio depende de como o seu conhecimento é partilhado, podendo comprometer até o verdadeiro significado de Progresso. Este progresso tecnológico evoluiu a grande velocidade desde a década de 80 e acarretou profundas mudanças políticas, sociais e económicas à escala mundial. A grande modificação, a globalização da economia, originou a quebra de barreiras comerciais entre as nações, aumentando o nível de competitividade do mercado e trazendo enormes mudanças estruturais nos processos produtivos. Aliado ao interesse económico, a necessidade de aumentar a produção devido ao crescimento populacional no mundo, exige a procura de novas técnicas de produção de alimentos.

O homem encontrou a solução! Por um lado, aumentou a produção animal, confinando os animais em espaços muitíssimo reduzidos, para que gastem pouca energia ao movimentarem-se, alimentando-os com rações preparadas e injetando-lhes hormonas de crescimento, de forma fazê-los crescer muito e mais depressa. Este confinamento potencia o aparecimento de doenças que se propagam e comprometem toda a produção. Mas o homem também resolveu administrar antibióticos (que influenciam a saúde do homem) para evitar a perda de animais, ou seja, de dinheiro. Por outro lado, na agricultura, para além da maquinaria, e das modificações genéticas, utiliza como recurso milhares de químicos que aplica no solo e nas plantações, para prevenir ou exterminar pragas, para estimular o crescimento e garantir as características visuais exigidas pelos mercados. Parece perfeito não é?

Mas não é, e está longe de o ser! Não é de hoje que o desenvolvimento económico tem sido apontado como um dos determinantes da degradação do ambiente e da saúde humana. Os padrões de produção e consumo estão relacionados com a maioria dos problemas ambientais decorrentes do desenvolvimento tecnológico na pecuária, como a emissão de gases de efeito estufa, por exemplo. Os gases produzidos no estômago dos bovinos geram muito metano, que tem cerca de 21 vezes mais potencial de aquecimento que o CO2. Também os dejetos dos animais libertam gases, o óxido nitroso, com potencial de aquecimento 310 vezes superior. Juntamos a isto, a preocupação do CO2 libertado com o desmatamento de florestas para a produção de cereais para alimentação do gado e para pastos. Nos EUA, o Departamento de Agricultura estima que os animais confinados geram aproximadamente 500 milhões de toneladas de dejetos por ano, três vezes mais resíduos brutos que os gerados pela população norte-americana. E segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), o setor pecuário emite mais gases causadores do efeito de estufa que os automóveis.

Também na agricultura são relevantes os feitos da evolução económico-tecnológica, com as brutais doses de pesticidas aplicados na produção agrícola. Com o objetivo de proteger, prevenir e aumentar a produção, são usados diversos produtos químicos, desde praguicidas, herbicidas, fungicidas, fertilizantes, adubos, etc. A contaminação pelos agrotóxicos, acontece direta e indiretamente através da contaminação dos solos, das águas, dos alimentos e das pessoas. Estes poluentes são usados de forma descontrolada e abusiva, passam da terra para os pastos, dos pastos para os animais e destes para a carne, o leite e finalmente para o topo da cadeia alimentar, o homem, acumulando-se progressivamente, trazendo graves problemas de saúde. A aplicação de fertilizantes nitrogenados, por exemplo, trazem graves problemas à saúde humana e ao meio ambiente, contaminando as águas através dos lençóis freáticos. O consumo, mesmo que por curtos períodos, de água com valores de nitratos acima de estabelecido, pode causar problemas no transporte de oxigénio ao cérebro e outros órgãos, especialmente em crianças, grávidas e idosos. Alguns pesticidas podem persistir na comida por períodos consideráveis, se estes são pulverizados (o que acontece com frequência), antes da colheita, sem o intervalo de segurança exigido, estas substâncias podem perdurar nos alimentos até estes serem distribuídos e consumidos, provocando intoxicações. Outros pesticidas, derivados do petróleo, são pouco solúveis em água, o que os torna mais tóxicos e de elevada absorção cutânea, mas também a nível digestivo e respiratório.

São muitos os estudos que comprovam a toxicidade destes produtos, que se vão acumulando no organismo e degradando a saúde e qualidade de vida. A forma mais comum de acumulação destas substâncias no organismo é no tecido adiposo, pelo que o consumo de carnes, e produtos lácteos é a forma mais comum de contaminação, seguidos dos produtos hortícolas. Milhões de toneladas de pesticidas são aplicados todos os anos nos cultivos, sendo os resíduos encontrados em frutas e vegetais. São comuns os resíduos múltiplos e alguns estudos sugerem que o seu efeito é centenas de vezes mais tóxico do que os mesmos compostos individualmente. Associados a intoxicações crónicas e agudas, levando mesmo à morte, a lista dos problemas identificados causados pela acumulação no organismo destes produtos é longa. Enxaquecas, abortos espontâneos, alterações do comportamento, alterações genéticas, infertilidade, alterações hormonais, alterações da coagulação sanguínea, lesões hepáticas, distúrbios sensoriais, do equilíbrio e musculares, cancro. A Agência de Proteção Ambiental dos EUA classifica os resíduos de pesticidas entre os três principais riscos ambientais relacionados com o cancro.

Uma outra questão completamente ignorada e negligenciada pelos produtores é a qualidade nutricional dos produtos hortícolas, pelo facto de o interesse maior ser o rápido crescimento dos produtos e o aspeto visual. Os solos excessivamente explorados tornam-se esgotados em minerais. Assim como os adubos, as técnicas de melhoramento genético, tornam os produtos de cultivo muito mais pobres nutricionalmente, o que faz com que a variação, por exemplo, de vitamina C nas laranjas, possa ser de entre 0 e 180mg. É verdade, podemos encontrar hoje em supermercados, laranjas sem nenhum conteúdo de vitamina C. Também o processo de refinação empobrece os alimentos, para termos noção, alimentos como arroz, farinhas e açúcar refinados têm cerca de 77% menos quantidade de zinco que as variedades integrais. Muitas vezes o que temos, quando compramos frutas grandes e de bom aspeto, é na sua maioria água.

Atualmente discute-se o desenvolvimento tendo como objetivo a sustentabilidade. A sociedade está a tornar-se mais exigente nas questões ambientais e da saúde. Fatores como produção sustentável, conservação do meio ambiente, segurança alimentar, estão em cima da mesa e mostram-se fundamentais para ir ao encontro das exigências dos consumidores. Até há pouco tempo considerava-se apenas a perspetiva económica, no entanto a mudança está a acontecer e a crescer a necessidade de aumentar consciências e responsabilidades sobre o tema. As empresas para se manterem competitivas, terão de ter em conta, também, estas novas exigências, e oferecer produtos socialmente corretos, o que implica preocupação com o meio ambiente, a saúde dos consumidores, bem como o relacionamento ético com os mesmos. Urge uma mudança de valores, e embora a questão económica tenda a impor-se, a dimensão social e ambiental começam a ser valorizadas.


Source: International Vegetarian Week
Author: Cláudia Maranhoto, dietista


Date: 2012-07-21